quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Eu sou o que eu moro, o que faço, o que eu (não) sei.

É num dia que eu to ilhada em casa, que em outras circunstâncias me faria ficar muito feliz, mas hoje bateu errado. Eu tinha uma vida programada que acabou por ser destruída por causa de uma chuva torrencial, simples consequência de um calor infernal (É, o verão já chegou. Já tá aí!). Eu devia estar adiantando meus trabalhos e tantas outras coisas que eu reclamei de não ter tempo algum de fazer, mas justo agora que eu arranjei um tempo extraordinário, eu não consigo parar de pensar e, portanto eu preciso escrever.
É num país que chamamos de tropical que não conseguimos lidar com a ideia de chuvas tão fortes e tão repentinas. Quando você tem um calor que chega a 40 graus, não é de se esperar que isso tenha reações posteriores. É uma questão de Ensino Fundamental, básica, o que me faz pensar no quanto a gente tá precisando aprender. É porque, bem no início da nossa educação a gente aprende como são formadas essas tais nuvens de tempestades e a gente percebe que pela posição do país de acordo com aquelas centenas de linhas que dividem todo o planeta terra tem uma propensão a certos acontecimentos por aí. Não sejamos tolos, por favor.
Parabéns pra vocês, queridos prefeito, governador, e todos os nossos lindos responsáveis pelos projetos de saneamento básico, de infraestrutura de uma forma geral, do Rio de Janeiro, que apostam na ignorância da população pra que acreditem na ideia de que fomos pegos de supresa, de que nunca estaremos preparados para situações do tipo, de que não tínhamos como prever o acontecido.
Mas isso não é o pior do que passou pela minha cabeça. Eu tinha compromissos na Zona Sul. Sim, eu tinha que sair da baixada fluminense, como faço sempre, e chegar até a minha querida faculdade, em Botafogo, pra que eu ensaiasse uma peça, a qual estreia sexta-feira (Prometeu, as 20h, Entrada Franca, Senhas distribuídas a partir das 19h. Venham de branco, tragam sapatos confortáveis e 1kg de alimento não perecível). Obviamente, eu não consegui colocar o pé pra fora de casa, e quando consegui, não fui muito longe da minha própria cidade. Ou seja, da cidade do Rio de Janeiro eu estou banida, por hoje. Liguei a TV e percebi que não era a única e que não era só aqui. Toda a Baixada Fluminense estava em caos e não só ela, a Zona Norte do Rio de Janeiro, o Centro, as principais vias expressas do Rio e Grande Rio, tudo estava parado, molhado, inundado. Não existia trem, não existia ônibus (botes, JetSki, quem sabe!).
O mais surpreendente é que a Zona Sul pareceu não muito afetada. Justamente para onde eu precisava ir, estava divina. Não posso dizer com toda a certeza, mas eu procurei e nenhuma notícia de caos por lá. Estava divina, talvez um pouco chateada por Copacabana não ser tão bonita debaixo de garoa, quanto é debaixo do sol brilhante. Todos os meus companheiros de elenco (quase todos, na verdade) moram por lá e, consequentemente, conseguiram chegar felizes, com o mínimo de atraso pela chuva, até o local de ensaio. E eu (HAHAHA) estava bem longe disso.
Avisando aos meus colegas do meu martírio, fui (e sempre sou, porque essa não é a primeira vez que acontece) questionada da razão porque eu não passo alguns dias na casa de uns amigos. Ou porque eu não me mudo de vez pra lá. Resolvi então responder de uma forma muito educada.
Eu sei que seria muito melhor pra mim, de certa forma. Eu sei que eu teria uma comodidade absurda pra chegar à faculdade, eu sei que eu poderia pesquisar de forma muito mais interessante. Sei que poderia sair de noite e voltar sem muitos problemas. Sei que eu poderia assistir a peças maravilhosas quando eu quisesse. Sei que eu dormiria mais. Sei que eu comeria melhor. Sei que eu teria rendido um tanto a mais nesse final de ano. E é justamente por isso que eu não estou muito “afim” de me mudar.
Eu não quero essa facilidade porque eu nasci na baixada e eu nunca a tive. Não que seja por uma questão de egoísmo, de estar pensando muito em mim, mas eu acho que parte da minha vontade de fazer teatro é pensar nos outros. Eu sei o que eu passei por tanto tempo enquanto eu não tinha ideia de que existia um mundo que me acolheria do lado de lá. O quando eu tinha que me programar pra simplesmente assistir a um espetáculo que me interessasse, porque ele passava as onze horas da noite, na Gávea. Porque eu sei que como eu, existem centenas de jovens que gostam e que querem estar inseridos em uma realidade que lhes foi tirada.
Eu tenho muita sorte. Sorte de ter pais maravilhosos, de ter uma situação financeira que me permite viver de uma forma relativamente tranquila e sorte de ter essa vontade. Sorte de não terem me cegado pra uma realidade que é talvez não fosse minha, no momento em que eu tinha um carro com gasolina, pra ir até o centro, numa sexta feira e com o suficiente na carteira pra pagar um espetáculo num lugar razoável. Sorte de perceber que pessoas importantes na minha vida não tem a mesma sorte e que não merecem (sim, essa palavra: não merecem) ser tão prejudicadas.
É por isso que eu não me mudo, pela mesma razão que eu faço teatro. Porque se eu quero mudar alguma coisa, eu tenho que começar por aqui. Eu tenho que fazer teatro aqui, comer teatro aqui, viver teatro aqui, na minha Duque de Caxias tão cheia de problemas. É aqui que uma parte da população extremamente interessada fica a mercê de projetos culturais ínfimos. Aqui onde podemos contar nos dedos de uma só mão a quantidade de grupos que se envolvam ativamente em projetos teatrais e aos quais, muitos deles, cedem completamente a essa “fantasia Zona Sul”. É aqui onde, por não ganhar dinheiro, eu desisto de atuar, de dançar, de cantar, tocar, jogar, e de fazer o que eu realmente gosto. É exatamente nesse espaço que eu preciso trabalhar e é por isso que eu estou estudando. Não pra me encaixar em algo de lá, mas pra mudar isso daqui.
É absurdamente fácil seguir por certos caminhos que te trariam resultados de formas menos complicadas. Mas, uma professora me perguntou uma vez quem me disse que teatro era fácil! Essa sou eu. Eu sou meu lugar e se eu quero mudar a mim, eu preciso, mais do que tudo, mudá-lo junto.

I'm laughing at clouds, so high up above. 
The sun's in my heart and I'm ready for love.

Nenhum comentário:

Postar um comentário